Qual era a visão dos primeiros cristãos sobre aniversários?
- ICE JG
- 27 de abr.
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Quando analisamos como os primeiros cristãos passaram a celebrar o Natal, é essencial entender o contexto cultural da igreja primitiva. Curiosamente, nem os autores bíblicos nem os primeiros seguidores de Jesus demonstraram preocupação em registrar a data de seu nascimento - tampouco há evidências de celebrações natalinas antes do final do terceiro ou quarto século d.C.
A celebração de aniversários como conhecemos hoje é um fenômeno relativamente moderno, associado ao surgimento da sociedade industrial e à valorização da infância. Embora as culturas egípcia e mesopotâmica tenham desenvolvido calendários que permitiam calcular datas de nascimento, nas civilizações antigas e clássicas, festas de aniversário eram extremamente raras e, quando aconteciam, estavam restritas à realeza.
No Oriente, tradições variavam: famílias chinesas, por exemplo, celebravam aniversários principalmente na vida adulta, enquanto japoneses costumavam juntar todos os aniversários para celebrar no Ano Novo, transformando o evento em uma comemoração coletiva. A prática de contar a idade também era diferente em muitos lugares, como na cultura chinesa e coreana antiga, onde a idade era incrementada a cada Ano Novo Lunar, não no aniversário individual.
No judaísmo antigo, também não se encontravam celebrações de aniversário. De acordo com a Jewish Encyclopedia, festivais de aniversário eram associados a práticas pagãs e considerados inapropriados para o povo de Deus. Além disso, a literatura rabínica não registra festividades relacionadas ao nascimento de indivíduos. No Talmude, os aniversários dos reis pagãos eram vistos como feriados idólatras, com instruções claras para que os judeus evitassem envolvimento comercial próximo a essas datas.
Essa tradição influenciou diretamente os primeiros cristãos, já que o cristianismo surgiu dentro do contexto judaico. Os primeiros líderes da igreja — homens judeus — provavelmente herdaram essa falta de interesse em aniversários.
Ao longo das Escrituras, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, raramente se encontram registros de datas de nascimento. Grandes personagens como Abraão, Moisés e Davi não tiveram seus aniversários celebrados. Em toda a Bíblia, apenas dois aniversários são mencionados: o do Faraó (Gênesis 40:20-22) e o de Herodes (Marcos 6:21-27). Curiosamente, ambos os relatos estão ligados a eventos negativos — execuções — o que não contribui para uma visão positiva dessas comemorações.
Inclusive, textos como Gênesis 7:11 e 8:13 sugerem que a contagem do tempo na antiguidade estava mais ligada a ciclos anuais do que a datas pessoais.
Nos primeiros séculos do cristianismo, havia uma forte resistência à celebração de aniversários, inclusive o de Jesus. Orígenes de Alexandria, escrevendo em 245 d.C., destacou que apenas pecadores nas Escrituras celebravam aniversários. Já Arnóbio, por volta de 303 d.C., ridicularizou a ideia de atribuir aniversários até mesmo aos deuses.
Tertuliano, outro importante teólogo cristão primitivo, condenava a participação cristã em espetáculos que tinham raízes em celebrações pagãs, incluindo festivais de aniversário de imperadores. Essas fontes deixam claro que, para a igreja primitiva, celebrar aniversários não era apenas desnecessário - era visto como algo de forte conotação pagã.
Portanto, o que podemos entender é que a falta de ênfase nos aniversários entre os primeiros cristãos estava ligada à rejeição de práticas culturais pagãs e à simplicidade de sua fé.
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